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  • Foto do escritorElizandra Souza

Psicopatia: uma reflexão psicanalítica

Atualizado: 3 de mai. de 2023

Inicialmente, vale ressaltar que a palavra psicopatia tem mais relação com abordagens sociais do que com a própria Psicanálise. A utilização do termo psicopatia em textos psicanalíticos indica mais a tentativa de aproximação ao senso comum para destacar o tema e possibilitar a ampliação do conhecimento.


Geralmente, são chamados psicopatas aqueles que não se relacionam com afeição na sociedade ou não possuem sentimento de culpa e consideração. A associação entre psicopatia e violência é muito frequente, o que faz com que se acredite que o psicopata se comporte como um louco assassino. Comumente se relaciona a psicopatia aos comportamentos violentos com o único objetivo de maldade e total falta de empatia com o outro.

As características dirigidas aos ditos psicopatas são: egocentrismo, manipulação, impulsividade, megalomania, não estabelecimento de vínculos, sem medo de punição, necessidade de controle, intimidação. Essas características colocam o psicopata como uma pessoa com desvio de personalidade ou personalidade antissocial. Contudo, pode parecer uma pessoa muito “comum”, daquelas que quando cometem algum ato ilícito, nos questionamos sobre esta possibilidade.

A psicanálise encontra na psicopatia aquilo que diz respeito à estrutura perversa, onde o sujeito denega ou desmente a lei (interna e externa) e a faz funcionar para seu prazer. O perverso desconsidera as normas, as regras, a moral e o outro, por isso pode manipular. O perverso pode ser um bom articulador, pois sabe usar da sedução para convencer o outro de seus objetivos ou planejamentos.

A psicanálise nos coloca para pensar o sujeito através de conceitos como a pulsão, o inconsciente, o complexo de Édipo, bem como, pelas fantasias, pelos mecanismos de defesa e pelo superego. Dessa forma, pensar a psicopatia pela via psicanalítica é fazer referência à perversão, que se delimita a partir da passagem do sujeito pela castração.

Na Estrutura Clínica da Perversão, temos que o sujeito desmente a castração, ou seja, apesar de conhecê-la, nada quer saber. A castração, que acontece na passagem do Complexo de Édipo é o momento crucial para a criança, que depende desse momento para fazer ou não relação com a lei, com o simbólico e com o mundo.

Não podemos, dentro da teoria psicanalítica, apontar o que é considerado normal ou anormal, certo ou errado, para dizer da castração ou mesmo do Complexo de Édipo. Cada Estrutura Clínica (Neurose, Perversão ou Psicose) diz de um sujeito e de um tipo de submissão à castração. Assim, não podemos igualar a psicopatia a uma patologia mental. O psicopata não é doente, nem louco. O perverso segue, pelas vias da própria perversão, certos caminhos para sua satisfação, que vão de encontro com os objetos (materiais ou comportamentais) colocados no lugar da falta (para não reconhecer e não se submeter à castração).

O perverso é aquele que encontra prazer e satisfação em modalidades muito próprias, principalmente as conhecidas pelos sufixos “filias” e “ismos”: enofilia (satisfação pelo vinho), cromofilia (atração e satisfação pelas cores), que aparentemente não tem nada de sexual, tampouco é alguma infração. Ou como os “ismos”: sadismo, masoquismo, fetichismo. Por outro lado, o perverso pode ter como via de prazer e satisfação a relação com o poder, com o encantamento, com o discurso ou com o dinheiro. Por outro lado, temos também aquelas filias que determinam um ato criminoso como pedofilia, zoofilia, necrofilia. Deve-se ficar claro que a questão do delito tem seus parâmetros na lei social e não na lei simbólica, pensada pela Psicanálise.

Sabemos que o perverso é aquele que usa o desmentido para lidar com a castração, da mesma forma, o faz para lidar com a angústia da falta (resto da castração) e com a relação com o outro, com a lei e com o mundo (objetivo da castração). O sujeito perverso não quis saber da castração, não quis saber da angústia, não quis saber da lei que coloca o outro como ordenador.

Essa forma de lidar com a castração sugere que o perverso ignora a lei social, mas não é bem assim que acontece. O perverso vive muito bem em sociedade e muitas vezes se apresenta como uma pessoa extremamente virtuosa. Quando sua via de satisfação encontra lugar na relação sexual, tratam disso de forma discreta e secreta. Quando colocam o poder, o discurso ou o dinheiro como via de satisfação, podem ser grandes líderes, palestrantes ou empreendedores.

Acontece que o perverso, por desconsiderar a lei simbólica e sua própria angústia, desconsidera também o outro, enquanto sujeito de escolhas e de sentimentos. O perverso, então usa da manipulação para alcançar seus objetivos. Sem culpa e sem escrúpulos, faz com que o outro se angustie, faz com que o outro se sinta culpado. É aqueles capaz de dar um golpe numa pessoa sem recursos e indefesa, e ainda, faz a pessoa acreditar que a culpa é dela.

Portanto, não há o que diferenciar o perverso do psicopata para a psicanálise, visto que não podemos creditar ao psicopata apenas os comportamentos assassinos e violentos. Essa diferença fica mais na nomenclatura do que no comportamento. O psicopata age, independente do tempo ou da pessoa, na busca de seu prazer, podendo usar a superioridade, sua posição social, sua posição financeira, a maldade ou a enganação, ou mesmo a sedução e a manipulação, independente da possibilidade de fazer o outro sofrer ou não. E mais uma vez, não somente pela via da agressão. Por exemplo, uma pessoa que vive dando golpes pode ser um psicopata ou perverso.

Devemos entender que nem todo assassino é psicopata e nem todo psicopata é assassino. O psicopata tem uma certa intransigência na relação com o outro e se sente mais compelido a transgredir qualquer lei. Não podemos dizer que o perverso é maldoso por si só, pois sua intenção não é maltratar, mas buscar sua satisfação. Sua manipulação, ainda que possa fazer sofrer o outro, não tem intenção de pura maldade. Contudo, pode haver satisfação na superioridade e maldade, mas não necessariamente, a maldade da agressão ou da violência. Sua maldade pode estar numa atitude inescrupulosa ou mesmo de domínio, no poder.

O psicopata acredita que está acima do bem e do mal, da vida e da morte, por isso joga com sua superioridade e sua manipulação, para assim, se sentir no controle de tudo e de todos.

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